Casas mortas, casas vivas
Sua casa é viva ou morta? A pergunta soa estranha, com certeza. E você logo responderá que casa é algo inanimado.
A casa é feita de pedras, tijolos, madeira, portanto, não tem vida.
Entretanto,
casas existem que são mortas. Você as adentra e sente em todos os
cômodos a inexistência de vida. Sim, dentro delas habitam pessoas,
famílias inteiras.
Mas são aquelas casas em que quase tudo é
proibido. Tudo tem que estar tão arrumado, ajeitado, sempre, que não se
pode sentar no sofá porque se está arriscando sujar o revestimento novo e
caro.
Casas em que o quarto das crianças é impecável. Todos os
bichinhos de pelúcia, por ordem de cor e tamanho, repousam nas
prateleiras.
Essas casas são frias. Pequenas ou imensas,
carecem do calor da descontração, da luz da liberdade e da iluminada
possibilidade de dentro delas se respirar, cantar, viver.
Por isso mesmo parecem mortas.
As casas vivas já demonstram, desde o jardim, que nelas existe vibração e alegria.
No
gramado, a bola quieta fala da existência de muitos folguedos. A
bicicleta, meio deitada, perto da garagem, diz que pernas infantis até
há pouco a movimentaram com vigor.
Em todos os cômodos se
reflete a vida. No sofá, um ursinho de pelúcia denuncia a presença de um
pequenino irrequieto que carrega a sua preciosidade por todos os
cantos.
Na saleta, livros, cadernos e lápis dizem dos estudos
que se repetem durante horas. O dicionário aberto, um marcador de
páginas assinalando uma mensagem preciosa falam de pesquisa e leitura
atenciosa.
A cozinha exala a mensagem de que ali, a qualquer
momento, pode chegar alguém e se servir de um copo d´água, um café, um
pedaço de pão.
Os quartos traduzem a presença dos moradores. Cores alegres nas cortinas, janelas abertas para que o sol entre em abundância.
Os
travesseiros um pouco desajeitados deixam notar que as crianças os
jogam, vez ou outra, umas contra as outras, em alegres brincadeiras.
Enfim, as casas vivas são aquelas em que as pessoas podem viver com liberdade. O que não quer dizer com desordem.
As
casas vivas são aquelas nas quais os seus moradores já descobriram que
elas foram feitas para morar, mas sobretudo para se viver.
* * *
O
desapego às coisas terrenas inicia nas pequeninas coisas. Se
estabelecemos, em nosso lar, rígidas regras de comportamento para que
tudo esteja sempre impecável, como se pessoas ali não vivessem, estamos
demonstrando que o mais importante são as coisas, não as pessoas.
Manter
o asseio, a ordem é correto. Escravizar-se a detalhes, temer por
estragos significa exagerado apego a coisas que, em última análise,
somente existem em função das pessoas.
Transforme sua casa,
pequena, de madeira, uma mansão, num lugar agradável de se retornar, de
se viver, de se conviver com a família, os amigos, os amores.
Coloque
sinais de vida em todos os aposentos. Disponha flores nas janelas para
que quem passe, possa dizer: Esta é uma casa viva. É um lar.
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