Não existe um só homem de ciência que, depois de estudar e observar os
fenômenos, não se tenha rendido à evidência dos fatos, assim como nenhum deles
teve coragem até agora, em face do conjunto maravilhoso de tais fenômenos, de
negar, com justos motivos, a teoria espírita. O Prof. Charles Richet está
incluído nesse número.
Assim não fosse, não teríamos certamente aberto as
nossas colunas para celebrar a memória de um homem que sendo grande por todos os
motivos, se tornou ainda maior para nós, não pelo valor das suas descobertas e
grandeza do seu espírito pacifista, porque outros tantos como ele não têm
preocupado a nossa atenção, mas pela similitude de crença que nos une.
O Dr.
Henri Blondel publicou na “Revue Spirite”, de Paris, um substancioso artigo com
a epígrafe: “Charles Richet était-il spirite?” — no qual chega à conclusão de
que, de fato, o nosso saudoso Professor era, com efeito, espírita. Nós também
pensamos que assim seja, embora não seja esta a vontade dos terríveis
adversários do Espiritismo.
Mas como afirmar que não era espírita e que
morreu materialista, um homem que por mais de cinquenta anos dedicou toda a sua
inteligência, toda a sua atividade ao estudo dos fenômenos espíritas; tendo
escrito sobre esse assunto diversas obras, sem falar na revista por ele fundada,
em 1891 — “Anales des Sciences Psychiques”, cuja publicação foi suspensa em
1914, devido à grande guerra que incendiou a Europa!
Em 1905, o Prof. Richet
assistiu, em companhia do nosso Mestre Gabriel Delanne, às memoráveis sessões de
materializações na Vila Carmen, na Algéria, onde verificou fenômenos
verdadeiramente surpreendentes, não só de ectoplasmia, como também de
materializações de entidades que revelaram a sua identidade pessoal, e de
fotografias de espíritos. Essas sessões foram feitas com a máxima fiscalização e
absoluto controle, e os fatos foram tão positivos que o Prof. Richet subscreveu
uma ata, na qual declarou ter visto simultânea e nitidamente o Espírito
materializado — Bien Bôa e dois médiuns, que se prestavam para as experiências:
Martha e Aicha.
A sessão de 1º de setembro de 1905 foi, então, de um sucesso
formidável. O Prof. Richet tinha proposto a experiência da barita. Desejava
verificar a constituição orgânica do Espírito Bien Bôa. Se como nós viventes,
também o Espírito revestido do seu perispírito, em certo grau de materialização
tinha, ele também, pulmões para respirar, se como nós, também ele, “queimava
carbono.”
Mme. Noel pede para se fazer a experiência com a barita, proposta
pelo Professor. O Dr. Richet tinha preparado e levara uma dissolução de barita
num frasco com duas tubuladuras, uma das quais recebeu um tubo de cautchouc
munido de uma boquilha de osso. A pedido de Mme. Noel, Bien Bôa sai do gabinete
e vem à mesa, junto ao general Noel. Neste momento, a cortina do gabinete é
afastada e todos veem muito bem Martha (a médium) adormecida na cadeira. O Dr.
Delanne, para salientar bem a atitude de Richet, pergunta a este se vê bem a
médium, ao que o sábio responde que sim. Richet toma então o frasco, examina
novamente a dissolução para verificar a limpidez da mesma, põe-no na mesa, em
frente ao Espírito, dizendo-lhe para soprar pela boquilha. Assim o faz. Um sopro
forte e regular é ouvido por todos, logo após ouve-se o borbulhar do líquido e
vê-se uma nuvem branca muito espessa formar-se no líquido. Richet toma o franco
com emoção e verifica a formação do carbonato de barita. Todos aplaudem; Bien
Bôa saúda e entra no gabinete.
Só este fato bastaria para convencer ao
ilustre fisiologista, se outros não tivesse ele constatado. A memorável sessão
deixou patente que um indivíduo que viveu entre nós, que morreu, como se diz na
linguagem vulgar, voltou novamente formado, mostrando-se a uma plêiade de
experimentadores, que viram-no, tocaram-no; um ser que anda, que fala, que é
constituído interiormente como qualquer ser humano, pois queima carbono no seu
organismo.
Seria possível que o Professor Richet, em vista desse fato tão
categórico, continuasse com suas ideias materialistas?
O Dr. Charles Richet,
antes da sua iniciação no Espiritismo, havia se dedicado por muitos anos ao
estudo do hipnotismo, do magnetismo, do sonambulismo. Ele diz ter observado,
durante essas experiências, fenômenos importantes de anestesia com desdobramento
da personalidade, bem como outros importantíssimos fenômenos de
sonambulismo.
Foi em 1884, diz o Dr. Richet, que recebendo a visita do Consº
A. Aksakof, que naquela época era diretor do Psychische Studien, aceitou deste o
convite para estudar os fenômenos espíritas. A sua resposta ao sábio russo é
digna de menção: “Para aprender e conhecer os fenômenos espíritas, irei até o
fim do mundo.”
Poucos meses depois, justamente quando se faziam em Milão
experiências com Eusapia Paladino, a que compareciam Lombroso, Schiaparelli,
Chiaia, Finzi, o Conselheiro Aksakof escreveu ao Dr. Richet uma carta,
noticiando os fatos que se haviam verificado com essa portentosa médium, donde
se destacavam as seguintes palavras: “Não tendes necessidade de ir ao fim do
mundo. Basta vir ter comigo a Milão para ver coisas absolutamente
extraordinárias.”
Foi então que o ilustre cientista entregou-se francamente à
investigação e ao estudo desses fatos extranormais que têm, como único escopo, a
demonstração positiva da sobrevivência do homem à morte do corpo.
O ilustre
Prof. Dr. Christoph Schröder declarou em um jornal de Hamburgo que o Professor
Richet tomou parte em 200 sessões experimentais de materializações, nas quais
foram obtidas manifestações extraordinárias. E a este propósito o Dr. Richet
escreveu nos “Annales”: “Nenhuma contradição há entre a ciência e o fenômeno
mais extraordinário do Espiritismo. A materialização é um fato desconhecido,
estranho, inabitual, mas é um fenômeno que nada contradiz.”
Ninguém ignora
que William Crookes foi um espírita eminente e que os fenômenos por ele
constatados constituem um padrão de glória para o Espiritismo. Pois bem, o
Professor Richet, falando dos trabalhos de Crookes, diz: “As experiências de
Crookes são de granito e nenhuma crítica prevalece contra elas. Aconselho a
lerem com cuidado os relatos de Crookes e hão de se convencer da realidade dos
fatos, a menos que se resignem a tratar Crookes de imbecil, o que seria uma
imbecilidade.”
É preciso também não esquecer que o Professor Charles Richet
foi presidente da “Sociedade de Pesquisas Psíquicas”, de Londres, que nessa
época já havia ela publicado vinte e cinco grossos volumes que enfeixam
documentos valiosos que provam a existência de inteligências extraterrenas e a
realidade das comunicações destas com os homens.
Tudo isso vem confirmar que
o Dr. Richet não era materialista.
Observando o desdém com que eram recebidos
os fenômenos espíritas, Richet escreveu: “Quando a verdade sai do seu poço, nua
e trêmula, é escarnecida, injuriada, tratada de cínica e aventureira, mas a sua
influência é de tal modo que, depois de demoradas lutas, acaba sempre por ser
rainha...”
Lembrando o número insignificante de investigadores que existiam
naquela época, fez o Prof. Richet uma comparação com os primeiros tempos do
Cristianismo e lançou a seguinte frase: “Na hora presente aqueles que se ocupam
atualmente das coisas ocultas não passam de um punhado de investigadores. Mas os
doze apóstolos que rodearam Jesus Cristo eram menos ainda e conseguiram abrir o
caminho ao seu ideal.”
Nós não duvidamos que o Dr. Richet tivesse dúvidas
sobre certos pontos da teoria espírita, como teve no começo a respeito dos
fenômenos, mas estamos certos que a dúvida de Richet não era uma dúvida inativa,
como a que existe por aí, mas a dúvida de que fala o Professor Bozzano, a dúvida
fecunda, que estuda, que perquire, que experimenta para ver resolvida a questão
que assedia. Além disso, dubidare humanum est; o homem duvida sempre do que
desconhece e do que ainda não penetrou na sua mente; mas duvidar não quer dizer
— “não crer”. E se se duvida num ponto não se duvida do que já se estudou e
compreendeu. S. Paulo, o doutor das gentes, referindo-se à dúvida produtiva,
dizia: “Andamos pela fé e não pela visão: vemos por espelho de enigma, mas
veremos face a face.” Assim tem acontecido para os homens, por sábios que sejam,
em face de todas as verdades novas e todos os conhecimentos que nos vêm tirar do
obscurantismo: duvidamos, mas depois tornamo-nos seus adeptos fervorosos.
Não
é preciso irmos avante. Basta reproduzirmos a declaração do Professor Ernesto
Bozzano, publicada no “Psychic News” e transcrita depois por esta Revista, em
que o grande espírita italiano diz: — “É para mim um pensamento confortador, de
que no fim, eu era vitorioso, porque Richet morreu convencido do fato da
sobrevivência; mas ele só ficou convencido nos últimos meses de sua existência,
graças aos meus artigos na “Ricerca Psichica”. Este conhecimento inteligente da
imortalidade chegou justamente quando, após 50 anos da comprovação científica
das manifestações espíritas, Richet, que durante muitos anos havia entretido com
o Prof. Bozzano amistosas discussões sobre a causa dos fenômenos, deu mais um
passo avante, dissipou a sua dúvida, chegando à convicção da realidade. É assim
que aqueles, cuja dúvida é fecunda, resolvem em tempo oportuno as dificuldades
que os ensombram.
Muitos meses antes do passamento do Professor Charles
Richet, lhe enviamos um exemplar da obra de nossa autoria “A Vida no Outro
Mundo.” Passado pouco tempo, tivemos o prazer de receber o aviso de recepção que
nos foi enviado pelo distinto homem de ciência e que reproduzimos no fac-simile
acima, que justifica a nossa razão do estudo do “mistério da morte e da
metapsíquica.”
Se o Dr. Richet julgasse que a morte é o fim de tudo, e o
túmulo constituísse a última etapa da Vida, não terminaria, certamente, a sua
carta, com a sentença: “Mors janua vitae” — a morte é a porta da Vida; e sim
“Mors janua tumulis” — a morte é a porta da sepultura.
Vamos concluir
felicitando o Espírito de Charles Richet, pela sua entrada triunfante na
Espiritualidade; possa ela contribuir eficazmente para que uma biologia
hiperfísica ilumine as obscuridades da ciência biológica atual, e será esse dia
o do triunfo integral do Espiritismo, a mais admirável ciência demonstrativa da
imortalidade da alma de que tanto a humanidade carece para a sua regeneração e
espiritualização
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