Uma nova mudança
“Você não sente, não vê, mas eu não posso deixar de dizer, meu amigo,
Que uma nova mudança em breve vai acontecer.
O que há algum tempo era jovem, novo, hoje é antigo
E precisamos todos rejuvenescer!” (Belchior)
Os versos de Belchior que embalaram a juventude latino-americana (“sem dinheiro no banco, sem parentes importantes e vinda do interior”), nos anos 60, continuam atualíssimos... E, se me for permitido ousar, diria que demonstram a dualidade existente no movimento espírita de nossos dias, com incrível similaridade.
Foi em 1964 que o Brasil conheceu dias tormentosos, obscuros e intransigentes, época dolorosa e negra que se estendeu até 1979. Os filhos desses dias até hoje experimentam o temor em “não poder” entoar vozes diferentes daquelas que eram impostas por quem detinha o poder político-social. Muitos, inclusive, não reaprenderam a pensar por si mesmos, nem a fazer escolhas por si mesmos, esperando sempre que alguém lhes direcione a decisão.
Olho para o movimento espírita e me entristeço! O que devia ser um amplo espaço de construção, de entrosamento e de liberdade, transformou-se num ambiente de sacralização de condutas, impondo-se a obediência aos “mais antigos” da instituição, ou àqueles que facilmente aderiram à estrutura de poder local, regional, estadual, nacional... “Os descontentes que se mudem!”, parece ser o bordão entoado por quem assume o poder, seja na Casa Espírita, seja nos conselhos e federativas. E, em nome da aparente “tranqüilidade”, declinam que a discussão (e a dissensão) são “instrumentos das trevas”, ou que os “irmãozinhos estão obsidiados”, quando ousam divergir das orientações e apresentar alternativas diferentes, de pensamento e ação.
Dogmatizam a filosofia espírita em torno do que escreveu Kardec – mas, é claro, sem entender a profundidade daquilo que ele escreveu e ensinou – elegendo certos médiuns e Espíritos como intérpretes oficiais do pensamento espiritista. Recusam-se a contatar os espíritos desencarnados, para questioná-los acerca das questões da atualidade, com enunciados completamente antagônicos ao que prelecionou o Codificador (do tipo “o telefone só toca de lá para cá”) e advertindo que a obra de Kardec é intocável e só poderá ser “revista” em uma nova intervenção divina (por meio dos Espíritos Superiores), ao qual cognominam de “revelação”. Encastelam-se no poder, como donatários da verdade, assumindo a condição de “missionários” do trabalho espírita, ali permanecendo por décadas, como se o Espiritismo deles precisasse, e impedindo o acesso, democrático, das idéias e de seus subscritores, às tarefas e aos postos de serviço.
Porém, como Belchior, que com sua aparente ingenuidade cantava a vida, o amor, a paz e a resistência das idéias à massificação, ouso pensar que “uma nova mudança em breve vai acontecer”, pois “o que há algum tempo era jovem, novo, hoje é antigo” e nós, espíritas, conscientes do real papel das idéias no mundo, “precisamos todos rejuvenescer”.
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