O Espírito e a matéria
Estudos sobre a encarnação e sobre o homossexualismo
Allan Kardec pergunta, em O Livro dos Espíritos:
(141) Há alguma verdade na opinião dos que pensam que a alma é exterior e envolve o corpo?
–
A alma não está aprisionada no corpo como um pássaro numa gaiola.
Irradiante, ela brilha e se manifesta ao redor dele como a luz através
de um globo de vidro ou como o som ao redor de um centro sonoro. É desse
modo que se pode dizer que é exterior, mas não é o envoltório do corpo.
A alma tem dois envoltórios ou corpos: um sutil e leve, que é o
primeiro, chamado perispírito; o outro, grosseiro, material e pesado,
que é o corpo carnal. A alma é o centro de todos esses envoltórios, como
o germe o é numa semente, como já dissemos.
Esta questão nos leva a algumas reflexões.
Se
“a alma não está aprisionada no corpo” e “brilha e se manifesta ao
redor dele como a luz através de um globo de vidro” equivale dizer que,
de certa forma, jamais deixamos o mundo dos Espíritos e que nossa
manifestação no mundo físico é uma manifestação indireta, como afirmam
os Espíritos – “É desse modo que se pode dizer que é exterior”.
O
Espírito irradia ao redor do corpo, emitindo a este uma vontade
constante que o faz obedecer as suas ordens através de um liame condutor
que é o perispírito, assim como um homem manipula a sua marionete,
dando-lhe a impressão de vida, embora ele não seja a marionete e nem
tampouco a marionete seja dotada de vida.
NÃO TOCAMOS NA MATÉRIA
Sabe-se
que o corpo, embora composto de matéria orgânica, é destituído de vida,
assim como o perispírito que é fluido (ver em O Livro dos Espíritos,
257, Ensaio Teórico sobre a Sensação nos Espíritos); que a vida em si
tem como único princípio o Espírito, que é o ser inteligente e dotado de
vontade; que uma vez desligado do Espírito, o corpo deixa de funcionar e
dá-se o fenômeno da morte.
Durante sua ligação, o Espírito
entretém a vida do corpo pelo seu perispírito que é formado ao mesmo
tempo de fluidos ambientais, fluido elétrico, magnético, nervoso e
também de fluido vital (Ver O Livro dos Espíritos, Introdução ao Estudo
da Doutrina Espírita, tópico II, Alma, Princípio Vital e Fluido Vital). É
esse elemento – o perispírito – que dá vida ao corpo, ou, melhor
dizendo, vitalidade, permitindo assim ao Espírito exercer sobre ele sua
ação. Ora, se nós, Espíritos, somente podemos agir sobre o corpo físico
através de uma ponte, que é o perispírito, compreende-se daí que nossa
ação sobre a matéria é indireta e que de certo modo, não tocamos nela.
Vejamos mais sobre isso em O Livro dos Espíritos:
(27) Haveria, assim, dois elementos gerais do universo: a matéria e o Espírito?
–
Sim, e acima de tudo Deus, o Criador, o Pai de todas as coisas. Deus,
Espírito e matéria são o princípio de tudo o que existe, a trindade
universal. Mas ao elemento material é preciso acrescentar o fluido
universal, que faz o papel de intermediário entre o Espírito e a matéria
propriamente dita, muito grosseira para que o Espírito possa ter uma
ação sobre ela (...).
Como se vê, a matéria propriamente dita é
“muito grosseira para que o Espírito possa ter uma ação sobre ela”,
confirmando o fato de que nós, Espíritos, só agimos sobre ela de forma
indireta, segundo o que nos ensinam os Espíritos na pergunta 141, acima
citada. Assim, podemos crer que, de certa forma, nunca deixamos o mundo
dos Espíritos e que só podemos nos expressar no mundo físico graças ao
corpo perispiritual. A imagem de um garoto soltando pipa dá uma visão a
respeito de nossa ação externa sobre o corpo. O garoto é o Espírito, a
linha que sai do garoto à pipa é o perispírito e a pipa é o corpo que
obedece a vontade do Espírito, transmitida pela linha. A pipa não é o
garoto e o garoto não está dentro da pipa.
Outro exemplo que pode
nos ajudar a compreender esta questão: no filme Avatar o personagem
principal era um jovem que ao entrar em uma máquina era de certa forma
transportado à nova realidade, assumindo o corpo do seu avatar e o
manipulando como se fosse o seu, impondo-lhe direção e vontade. No
entanto, o jovem que era o verdadeiro ser por detrás daquele avatar, não
estava dentro do seu avatar, mas o manipulava de fora (se você não viu o
filme, aí vai uma excelente sugestão).
Em resumo, nós, Espíritos
encarnados na Terra, sofremos uma forte impressão das relações da vida
física através do perispírito que nos mantém ligado ao corpo. Todas as
impressões que o corpo sofre, são transmitidas ao Espírito através deste
condutor e essa impressão é tão forte que cria em nós a ilusão de que
estamos encerrados dentro de um corpo e muitas vezes que somos o próprio
corpo. Daí a expressão inúmeras vezes falada e ouvida “o meu Espírito”.
Sobre isso, vejamos o que nos ensina Allan Kardec em O Livro dos Espíritos:
(22 a) Que definição podeis dar da matéria?
– A matéria é o laço que prende o Espírito; é o instrumento de que ele se serve e sobre o qual, ao mesmo tempo, exerce sua ação.
“De
acordo com essa ideia, pode-se dizer que a matéria é o agente, o
intermediário, com a ajuda do qual, e sobre o qual, atua o Espírito.”
A
ligação entre Espírito e corpo é por vezes tão forte que gera uma
verdadeira inversão de valores, fazendo com que muitos Espíritos, quando
encarnados, acreditem que a matéria é tudo o que existe e que após a
morte, virá o nada. Alguns, ao desencarnar, percebem quase de imediato o
erro no qual mergulharam durante a vida, mas há aqueles que, mesmo
depois da morte, conservam a impressão deixada pelo corpo e mantêm-se
materialistas, mesmo no mundo dos Espíritos. Essa perturbação dura um
tempo maior ou menor, de acordo com o maior ou menor apego que o
Espírito possui em torno das questões materiais (ver questões 163 em
diante de O Livro dos Espíritos).
Vamos agora debater outra
teoria com base na pergunta 141, a respeito de nossa sexualidade,
enquanto na Terra. Para isso, mais uma vez recorremos a O Livro dos
Espíritos:
SEXO NOS ESPÍRITOS, HOMOSSEXUALIDADE
(200) Os Espíritos têm sexo?
–
Não como o entendeis, porque o sexo depende do organismo físico. Existe
entre eles amor e simpatia, mas fundados na identidade dos sentimentos.
(201) O Espírito que animou o corpo de um homem pode, em uma nova existência, animar o de uma mulher e vice-versa?
– Sim, são os mesmos Espíritos que animam os homens e as mulheres.
(202) Quando está na erraticidade, o Espírito prefere encarnar no corpo de um homem ou de uma mulher?
– Isso pouco importa ao Espírito. Depende das provas que deve suportar.
“Os
Espíritos encarnam como homens ou mulheres, porque não têm sexo. Como
devem progredir em tudo, cada sexo, assim como cada posição social, lhes
oferece provas, deveres especiais e a ocasião de adquirir experiência.
Aquele que encarnasse sempre como homem apenas saberia o que sabem os
homens.”
Onde queremos chegar?
É comum ouvirmos a seguinte
explicação para os casos de homossexualidade: um Espírito viveu
inúmeras vezes como mulher. Ao reencarnar como homem, conserva o
psiquismo feminino devido às inúmeras experiências de outrora e por
isso, pouco adaptado à nova realidade masculina, despeja por assim dizer
sobre o corpo masculino o psiquismo feminino conservado e torna-se
homossexual. A nosso ver, essa teoria, caso seja admitida como regra
geral e absoluta, pode dar a impressão de que se o Espírito viver várias
existências como homem ou mulher, será “por isso” homossexual.
O QUE ENSINA ALLAN KARDEC?
Allan
Kardec, na Revista Espírita, Janeiro de 1866, confirma a teoria acima
no artigo “As mulheres têm Alma?” e desse modo, apresentamo-la como um
dos motivos que podem levar ao homossexualismo. O erro ocorre quando a
usamos como absolutismo ou quando tentamos justificar o homossexualismo
por meio de ideias punitivas, atreladas invariavelmente a deslizes do
passado, o que geralmente caracteriza preconceito. Abaixo, colamos parte
das explicações de Kardec a respeito e a fonte, para aqueles que
desejam aprofundar o estudo:
“Numa nova encarnação, ele trará o
caráter e as inclinações que tinha como Espírito; se for avançado, fará
um homem avançado; se for atrasado, fará um homem atrasado. Mudando de
sexo, poderá, pois, sob essa impressão e em sua nova encarnação,
conservar os gostos, as tendências e o caráter inerentes ao sexo que
acaba de deixar. Assim se explicam certas anomalias aparentes que se
notam no caráter de certos homens e de certas mulheres” (RE, Jan. 1866).
Vemos
aí que o Espírito pode conservar traços das experiências passadas e
apresenta-los na vida atual. Desse modo, um Espírito que tenha vivido
como mulher, pode conservar os traços femininos e ao encarnar em um
corpo masculino, despejar sobre o mesmo “as tendências e o caráter
inerentes ao sexo que acaba de deixar”. Em decorrência disso, o corpo
que é o instrumento do Espírito, ao receber tais impressões, passa a
assumir comportamentos opostos ao seu gênero sexual, podendo ainda
sofrer alterações químicas hormonais devido ao psiquismo do Espírito
sobre ele.
Como vimos nas perguntas 200 em diante, os Espíritos
afirmam que o sexo “pouco importa” aos Espíritos, tendo em vista que os
Espíritos “não tem sexo”. Se o Espírito não tem sexo, equivale dizer
que, mesmo tendo encarnado inúmeras vezes como mulher, não irá conversar
disso senão experiências ou aparências.
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