A causa fundamental das revoluções – As religiões desviaram-se de sua finalidade e a
política não representa a evolução das coletividades – Armas perigosas em mãos de
crianças... – Sociologia e anúncio
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PEDRO LEOPOLDO, 6 – (Especial para O GLOBO, por Clementino de Alencar)
– Pouco depois da publicação, em nossas edições de 25 de maio último, das páginas psicografadas por Chico Xavier em resposta às proposições apresentadas pelo banqueiro Francisco Teixeira da Costa, e relativas a problemas econômicos e financeiros, alguém nos dissera que além daquelas respostas, o “médium” teria recebido também outras destinadas ao mesmo consulente e versando sobre questões de sociologia.
O fato de, quase ao mesmo tempo em que isso nos era comunicado, se haver o “médium”, pelos motivos já expostos, retirado por alguns dias para uma chácara fora de Pedro Leopoldo, nos impediu de obter imediata confirmação da existência de tais páginas.
Com o regresso de Chico Xavier, tocamos no assunto e ele então nos confirmou a comunicação que tivéramos: uma resposta sobre sociologia e destinada ao Sr. Francisco Teixeira da Costa, fora também psicografada na mesma semana da outra, sobre problemas econômicos e monetários, mais ou menos nas mesmas condições em que se dera a recepção da última.
Poderão as leis sociológicas precisar a sucessão dos fenômenos políticos e econômicos?
Ainda ontem não se realizou a sessão semanal na casa de José Cândido.
Aproveitaremos, pois, hoje, o dia para enviar essas outras páginas d resposta a proposições do Sr. Teixeira da Costa, do Banco Agrícola.
Como a mensagem já publicada, esta traz também ao pé, assinando-a, o nome de Joaquim Pedro d’Oliveira Martins, o grande historiador e economista português.
Foram estas as perguntas formuladas pelo Sr. Teixeira da Costa:
– As leis sociológicas poderão, em futuro próximo, precisar os fenômenos políticos e econômicos?
– Tende a sociologia a uma organização precisa, de maneira que possamos, por suas leis, prever os fenômenos que se devem suceder?
Cabal afirmativa
A resposta psicografada por Chico Xavier é longa e precisa e, pelo seu tom algo profético bem a poderíamos chamar de “revolucionária”.
Transcrevemo-la a seguir, na íntegra, intercalando-lhe, como de hábito, alguns subtítulos:
“– Tentarei o meu trabalho elucidativo replicando ao último dos quesitos das teses propostas as quais envolvem em si um problema de suma atualidade, digno de todas as mentalidades que se interessam pelo progresso humano. E a minha resposta, em tese, constitui cabal afirmativa às proposições enunciadas.
Integrando o quadro das ciências morais, a sociologia pode ser apreciada e analisada, apesar dos seus fenômenos abstratos, através de uma elaboração acurada e metódica do raciocínio. O estudo da história é o campo precípuo, onde lhe encontramos a evolução lenta, inscrita, porém, em fatos palpáveis.
A nossa história contemporânea, encetada pela França de 1789, com a declaração dos direitos do homem, consubstancia todos os movimentos do progresso social, iniciado pelas gerações primitivas e aí está como síntese gloriosa dos esforços da coletividade, das suas realizações superiores e experiências penosas em favor do indivíduo.
Da tribu às nacionalidades
Desnecessário será reportar-nos ao habitat do “Primata hominus”, já que o precioso trabalho da antropologia e paleontologia combinadas nos fornece todos os argumentos prestantes à apresentação do desenvolvimento social, do qual as vossas leis sociológicas são legítimos expoentes.
A família criou a tribu, as tribus edificaram a cidade e as cidades constituíram as nacionalidades. Cada povo trouxe ao edifício do progresso geral, sob todas as suas variadas formas, o produto da atividade que desdobraram coletivamente. Cada ciclo da história humana apresenta um vestígio fundamentalmente diverso dos que o antecederam e dos que lhe são posteriores, os quais, compilados ordenadamente no livro das civilizações, oferecem, ao espírito estudioso, a expressão de verdade contida no “semper ascendens”.
Os dois pólos da evolução humana
Entre um monumento megalítico e um monumento de vossa época, pólos da evolução do homem, está o histórico dos fenômenos sociais, correi atos a essa mesma evolução, patente em todos os tempos; as obras materiais são, em seu conjunto admirável, as vibrações exteriorizadas dos pensamentos, em evolução permanente.
Os fósseis do período neolítico, os tempos faraônicos de Mikerinos, a legislação de Sólon, o pensamento de Cícero e a Revolução Francesa, são estágios que emergem na história como selos diferentes do progresso do mundo. Todas as descobertas notáveis e todas as guerras assinalam transições que eqüivalem a renovações benfeitoras.
A causa fundamental das revoluções
Os fenômenos políticos marcham paralelos aos fenômenos sociais. Os primeiros são como resultantes dos segundos. A mentalidade de uma época é que determina inflexivelmente os programas da atividade política; é sua fonte, sua origem, sua incoercível força geradora; e, quando não se opera essa combinação harmônica, natural, as reações aparecem como protesto solene da tarefa evolutiva dos séculos, revoluções estas que se acham nos capítulos da história de todos os países.
A política representa o indivíduo, a sociologia representa a coletividade. Quando o desacordo se manifesta entre ambas, estabelece-se a luta mais acèrrima para que se restabeleçam o equilíbrio e a ordem.
É um fato natural.
Como conquistar a veneração da história
As individualidades e as organizações que as representam só se impõem à veneração da história quando laboram em benefício do bem geral que é o progresso coletivo. Quando as suas atividades se desviam desse objeto nobilíssimo e único, se expõem à desclassificação que significa em si a verdadeira morte.
A previsão possível dos fenômenos
Considerando-se, portanto, o progresso em sua ascensão ininterrupta, concluímos que as leis sociológicas tendem a uma organização precisa, de maneira que poderemos, por seu intermédio, prever, em sua generalidade, os fenômenos econômicos e políticos que serão levados a efeito.
Transformações num futuro próximo
O vosso tempo é de dinamismo e de sumo progresso científico. A vossa civilização está cheia de resplendores e comodidades; num futuro próximo, porém, assistireis a bruscas transformações, porque a sociologia e a política se encontram em pólos antagônicos. As religiões, que são chamadas a desenvolver uma atividade superior como colaboradoras efetivas das ciências morais, desviaram-se para terrenos resvaladiços; e a política, em geral, não representa a evolução das coletividades.
Infelizmente, o excessivo amor à personalidade tem anulado idéias nobres, na tentativa de corromper o trabalho efetuado na Terra por inúmeros espíritos de eleição.
A economia política, ciência desmantelada pela política do isolamento A economia política, cuja tarefa é orientar a produção e o consumo da riqueza coletiva, é uma ciência desmantelada, porque a moral evoluiu teoricamente sem que a sua prática interessasse à maior parte dos encarregados de zelar pelo patrimônio dos
povos.
Em contraposição às leis fraternais, propagadas pelos arautos do bem-estar social, criou-se o falso patriotismo, ao qual a abominável autarquia deve a sua paternidade.
O eclipse dos ideais generosos da Humanidade
A economia é como a vida, cuja continuação depende de trocas incessantes. A política anti-fraterna do isolamento empobreceu o comércio, engendrando na atualidade as crises extraordinárias da superprodução e das inflações de crédito. A egolatria do capitalismo não lhe permitiu corresponder às aquisições do progresso da Humanidade, e quase todos os ideais generosos do coração humano estão eclipsados. Não duvideis, porem, da sua eclosão, em breve porvir, em busca da concretização.
A personalidade só se valoriza quando raciocina pela consciência coletiva
A sociologia tem as suas teorias avançadas e é necessário que os acontecimentos econômicos e políticos a acompanhem; já tendes observado em vosso século o anelo de emancipação das conquistas sociais que procuram romper a cadeia que lhes foi imposta pelo egoísmo individual Como última defesa desse egoísmo têm-se instituído em vossos tempos, os governos fortes; mas a personalidade somente se valoriza quando raciocina pela consciência coletiva. A sociologia tende a passos largos para uma organização definida reguladora de todos os progressos da ciência moral, apesar dos partidários de Pirron, que pululam em todos os agrupamentos humanos, cépticos e indiferentes quanto ao aperfeiçoamento esperado. Inevitáveis são as lutas que a realização dessas conquistas
implica, e a moral, sob a flâmula do espiritualismo, será a força-controle de formidáveis combates que se anunciam como movimentos que dirimirão o conflito entre o trabalho evolutivo e a tentativa de estacionamento provocada por elementos nocivos à ordem das leis do direito, em todas as suas modalidades.
Armas perigosas em mãos de crianças...
O vosso século, desde os seus pródromos, tem sido de lutas precursoras dessa regeneração dos costumes políticos de todas as nacionalidades evoluídas do planeta, os quais requerem urgentemente o braço da fraternidade para que se mantenham de pé na confusão reinante; e a lição espiritualista em vossos tempos significa um apelo do Céu para que as civilizações da Terra não se extingam, porquanto o homem atingiu tal culminância no domínio científico que as suas possibilidades são como armas perigosas em mãos de crianças. Faz-se mister conhecer o enigma da sua personalidade espiritual se não deseja cair vitimado por suas próprias mãos.
Apenas deduções lógicas e razoáveis...
Não estadeamos horripilantes profecias; apenas efetuamos deduções lógicas e razoáveis sobre o vasto apanhado da situação atual do mundo.
Cada organismo político, como os sistemas religiosos, possui sua ação em uma época determinada do progresso geral. Cada organização que expressa uma conquista nova sente a tenacíssima resistência do sistema com decadência. Os ideais nobres que encarnam a nova modalidade evolutiva são registrados pelas mentes de escol que se acham na Terra em correspondência com os planos superiores, as quais os disseminam através da palavra falada ou escrita, permanecendo assim na alma da coletividade como energias potenciais. Um estado, porém, aparece que define a maturação do espírito geral; a luta se estabelece e a idéia nova triunfa.
A marcha para o coletivismo
Todo o organismo social marcha para o coletivismo, dentro do qual todo o porvir humano está esboçado; ele será o restaurador de todas as anomalias econômicas das nacionalidades, o regulador dos fenômenos sociológicos, o descobridor das verdadeiras aptidões administrativas para os Governos, a força inteligente e diretora que estudará as possibilidades de cada um para o engrandecimento coletivo. Todas as personalidades contrárias ao progresso cederão diante da necessidade dessas leis porque se faz mister a comunhão de todos os homens, para que todo o indivíduo procure viver a existência da coletividade.
Joaquim Pedro d’Oliveira Martins
Uma casa à venda
A mesma mão que psicografou essas páginas, nós a surpreendemos esta manhã,
quando escrevia sobre o balcão tosco da venda de “seu” Zé Felizardo, num pedaço de
parede esta frase que exprime toda uma precária situação:
– “Vende-se esta casa”.
E, escrevendo humildemente, essa quase confissão de falência e desamparo, Chico
Xavier sorria-nos, com o sorriso débil e a expressão boa dos resignados.
Notáveis Reportagens com Chico Xavier. IDE
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