A Caminho da Luz

sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

CAPÍTULO 3 MÉTODO










CAPÍTULO
3
MÉTODO
18 Um desejo natural e muito louvável de todo espírita – desejo que
se deve sempre encorajar – é o de fazer prosélitos, isto é, novos seguidores.
Foi em vista de facilitar sua tarefa que nos propusemos a examinar
aqui o caminho mais seguro, conforme nosso ponto de vista, para atingir
esse objetivo, a fim de poupar esforços inúteis.
Dissemos que o Espiritismo é toda uma ciência, toda uma filosofia;
aquele que quer conhecê-lo seriamente deve, como condição primeira,
dedicar-se a um estudo sério e se compenetrar que, mais do que qualquer
outra ciência, ele não pode ser aprendido brincando. O Espiritismo, como
já dissemos, aborda todas as questões que interessam a humanidade;
seu campo é imenso e é, principalmente, em suas conseqüências que
convém ser examinado. A crença nos Espíritos sem dúvida forma sua
base, mas não é suficiente para formar um espírita esclarecido, da mesma
forma que a crença em Deus não basta para formar um teólogo. Vejamos
de que modo convém ensinar a Doutrina Espírita para levar mais seriamente
à convicção.
Que os espíritas não se espantem com a palavra ensinar; ensinar não
é somente o que se faz do alto da cátedra ou da tribuna; há também o da
simples conversação. Toda pessoa que procura convencer uma outra,
seja por explicações, seja por experiências, pratica o ensinamento; o que
desejamos é que esse esforço alcance resultados, e é por isso que julgamos
dever dar alguns conselhos igualmente proveitosos para os que
querem se instruir por si mesmos; neles encontrarão o modo de chegar
mais segura e rapidamente ao objetivo.
19 Acredita-se geralmente que, para convencer alguém, basta mostrar
os fatos; esse parece sem dúvida o caminho mais lógico; entretanto, a
experiência mostra que nem sempre é o melhor a se fazer, porque há
pessoas a quem os fatos mais evidentes não convencem de maneira
alguma. Por que isso acontece? É o que vamos tentar demonstrar.
No Espiritismo, crer na existência dos Espíritos é questão secundária;
é uma conseqüência, não o ponto de partida. É aí precisamente que está o
nó da questão que muitas vezes provoca repulsa a certas pessoas.
Os Espíritos não são outra coisa senão a alma dos homens. Assim, o
verdadeiro ponto de partida é a existência da alma. Como pode o materialista
admitir que seres vivem fora do mundo material quando acredita

que ele mesmo é apenas matéria? Como pode admitir Espíritos à sua
volta se não acredita ter um em si? Em vão reuniremos diante de seus
olhos as provas mais palpáveis; ele contestará todas, porque não admite
o princípio. Todo ensinamento metódico deve caminhar do conhecido
para o desconhecido, e para o materialista o conhecido é a matéria;
deve-se partir da matéria e procurar, antes de tudo, levá-lo a observá-la,
convencê-lo de que há alguma coisa que escapa às leis da matéria; em
uma palavra, antes de o tornar espírita, tentai torná-lo espiritualista*; para
isso, há toda uma outra ordem de fatos, um ensinamento todo especial
em que é preciso proceder por outros meios. Falar-lhe dos Espíritos
antes de ele estar convencido de ter uma alma é começar por onde seria
preciso acabar, porque ele não pode admitir a conclusão se não admite
as bases. Antes de começar a convencer um incrédulo, mesmo pelos
fatos, convém se assegurar de sua opinião em relação à alma, ou seja, se
ele acredita na sua existência, na sua sobrevivência ao corpo, na sua
individualidade após a morte; se a resposta for negativa, será trabalho
perdido falar-lhe dos Espíritos. Eis a regra. Não dizemos que não haja
exceções, mas nesse caso há provavelmente outra causa que o torna
menos refratário.
20 Entre os materialistas, é preciso distinguir duas classes: na primeira
os que o são por sistema; para eles não há dúvida, apenas a negação
absoluta, raciocinada à sua maneira; aos seus olhos, o homem é apenas
uma máquina que funciona enquanto está viva, que se desarranja e da
qual, após a morte, resta apenas a carcaça. São, felizmente, em número
muito pequeno e não constituem em nenhuma parte uma escola altamente
reconhecida; não temos necessidade em insistir sobre os deploráveis efeitos
que resultariam para a ordem social a propagação de uma doutrina semelhante;
fomos suficientemente esclarecidos sobre esse assunto em O Livro
dos Espíritos, questão no 147, e Conclusão, item no 3.
Quando dissemos que a dúvida cessa para os incrédulos com uma
explicação racional, é preciso excluir destes os materialistas, pelo menos
os que negam qualquer poder ou princípio inteligente fora da matéria; a
maioria deles teima em sua opinião por orgulho e acredita por amor-próprio
que são obrigados a persistir nisso; persistem, apesar de todas as provas
contrárias, porque não querem se rebaixar. Com essas pessoas, não há
nada a fazer; não é preciso nem mesmo se deixar levar pelas falsas
* Espiritualista: todo aquele que acredita que tem em si algo mais do que o corpo material, ao
qual dá os mais variados nomes: alma, espírito, essência, centelha, sopro etc., mas que nem por
isso deve ser considerado espírita, ao passo que todo o espírita é espiritualista (Veja em O Livro
dos Espíritos, Introdução, item no 2, “A Alma”) (N.E.).

aparências de sinceridade dos que dizem: “faça-me ver e acreditarei”.
Há os que são mais francos e dizem vaidosamente: “ainda que visse
não acreditaria”.
21 A segunda classe dos materialistas é muito mais numerosa, porque
o verdadeiro materialismo é neles um sentimento antinatural; compreende
os que o são por indiferença e, pode-se dizer, por falta de coisa melhor;
não o são de caso pensado, e o que mais desejam é crer, porque para
eles a incerteza é um tormento. Há neles uma vaga aspiração em relação
ao futuro; mas esse futuro lhes foi apresentado de uma forma que sua
razão não pode aceitar; daí a dúvida e, como conseqüência da dúvida, a
incredulidade. Para eles, a incredulidade não é um sistema; apresentai-lhes
algo de racional e o aceitam de bom grado, estes podem nos compreender,
porque estão mais perto de nós do que eles mesmos pensam. Aos primeiros
não se deve falar nem de revelação, nem de anjos, nem de paraíso,
pois não compreenderiam; mas, ao vos colocar no seu terreno, provai-lhes
primeiramente que as leis da fisiologia são impotentes para explicar tudo;
o resto virá a seguir. É muito diferente quando a incredulidade não é preconcebida,
porque assim a crença não é absolutamente nula; há um
germe latente sufocado pelas ervas daninhas, mas que uma faísca pode
reanimar; é o cego a quem se restitui a visão e que fica feliz em rever a luz,
é o náufrago a quem se estende uma tábua de salvação.
22 Ao lado dos materialistas propriamente ditos, há uma terceira
classe de incrédulos que, embora espiritualistas, pelo menos de nome,
não são menos refratários; são os incrédulos de má vontade. Estes ficariam
zangados em acreditar, porque isso perturbaria sua satisfação com
os prazeres materiais; receiam ver condenadas a ambição, o egoísmo e
as vaidades humanas, que são os seus prazeres; fecham os olhos para
não ver e tapam os ouvidos para não ouvir. Só se pode lamentá-los.
23 Citemos apenas para mencioná-la uma quarta categoria, que chamaremos
de incrédulos interesseiros ou de má-fé. Estes sabem muito bem
tudo em relação ao Espiritismo, mas o condenam ostensivamente por
interesse pessoal. Não há nada a dizer sobre eles, como não há nada a
fazer com eles. Se o materialista puro se engana, tem pelo menos a seu
favor a desculpa da boa-fé; pode-se corrigi-lo ao provar o erro; porém,
nesta categoria de que falamos, há uma determinação radical contra a
qual todos os argumentos se chocam; o tempo se encarregará de lhes
abrir os olhos e lhes mostrar, talvez à custa de sofrimento, onde estavam
seus verdadeiros interesses, porque, não podendo impedir que a verdade
se espalhe, serão arrastados pela torrente, juntamente com os interesses
que acreditavam salvaguardar.

24 Além de todas essas categorias de opositores, há uma infinidade
de nuanças entre as quais se podem contar os incrédulos por covardia: a
coragem lhes virá quando virem que os outros não se prejudicam; os
incrédulos por escrúpulos religiosos: um estudo esclarecido lhes ensinará
que o Espiritismo se apóia sobre as bases fundamentais da religião e
respeita todas as crenças e que uma das suas conseqüências é dar
sentimentos religiosos aos que não os têm e fortificá-los naqueles em
que estão vacilantes; há ainda os incrédulos por orgulho, por espírito de
contradição, por indiferença, por leviandade etc. etc.
25 Não podemos omitir uma categoria que chamaremos de incrédulos
por decepções. São pessoas que passaram de uma confiança
exagerada à incredulidade, causada por decepções; então, desencorajadas,
abandonaram e rejeitaram tudo. É como se alguém negasse a
honestidade só por ter sido enganado. É a conseqüência de um estudo
incompleto do Espiritismo e da falta de experiência. Os Espíritos enganam
geralmente aqueles que lhes solicitam o que não devem ou não podem
dizer e que não são esclarecidos o suficiente sobre o assunto para discernir
a verdade da impostura. Muitos, aliás, vêem o Espiritismo apenas
como um novo meio de adivinhação e imaginam que os Espíritos existem
para adivinhar o futuro; acontece que os Espíritos levianos e zombeteiros
não deixam de se divertir à custa dos que pensam dessa forma; é por
isso que prometem marido às moças; ao ambicioso, honras, heranças,
tesouros escondidos etc.; daí surgem, muitas vezes, decepções desagradáveis,
das quais o homem sério e prudente sempre sabe se preservar.
26 Uma outra classe, a mais numerosa de todas, mas que não podemos
classificar como opositores, é a dos indecisos; geralmente são
espiritualistas por princípio; na sua maioria, têm uma vaga intuição das
idéias espíritas, uma aspiração para algo que não podem definir. Falta-lhes
somente formular e coordenar os pensamentos; para eles, o Espiritismo é
como um raio de luz: é a claridade que dissipa o nevoeiro; por isso o
acolhem com entusiasmo, porque os liberta das angústias da incerteza.
27 Se continuarmos examinando as diversas categorias dos que
crêem, encontraremos também os espíritas sem o saberem; e, especificamente
falando é uma variedade ou uma nuança da classe dos indecisos.
Sem nunca terem ouvido falar na Doutrina Espírita, possuem o sentimento
inato dos seus grandes princípios, e esse sentimento se percebe
em algumas passagens de seus escritos e discursos, a tal ponto que,
ao ouvi-los, julgaríamos que são conhecedores da Doutrina. Encontra-se
numerosos exemplos disso nos escritores sacros e profanos, nos poetas,
nos oradores, nos moralistas, nos filósofos antigos e modernos.

28 Dentre aqueles que aceitaram a Doutrina Espírita estudando-a,
podemos distinguir:
1o) Aqueles que acreditam pura e simplesmente nas manifestações
dos Espíritos. O Espiritismo é para eles uma simples ciência da observação,
uma série de fatos mais ou menos curiosos; nós os chamaremos
espíritas experimentadores.
2o) Aqueles que não vêem no Espiritismo nada além dos fatos; compreendem
a parte da filosofia, admiram a moral que dela se origina, mas
não a praticam. A influência da Doutrina sobre seu caráter é insignificante
ou nula; não mudam nada em seus costumes e não renunciam a
um único prazer: o avarento continua a ser mesquinho; o orgulhoso,
sempre cheio de amor-próprio; o invejoso e o ciumento sempre hostis;
para estes, a caridade cristã é apenas uma bela máxima; são os espíritas
imperfeitos.
3o) Aqueles que não se contentam em admirar a moral espírita, mas
que a praticam e aceitam todas as suas conseqüências. Convencidos de
que a existência terrestre é uma prova passageira, fazem o possível para
aproveitar esses curtos instantes e avançar na direção do caminho do
progresso, para poderem se elevar na hierarquia do mundo dos Espíritos,
esforçando-se para fazer o bem e reprimir suas tendências para o mal.
A caridade está em todas as coisas, é a regra para sua conduta; aí estão
os verdadeiros espíritas, ou melhor, os espíritas cristãos.
4o) Finalmente, há os espíritas exaltados. A espécie humana seria
perfeita se tomasse sempre o lado bom das coisas. O exagero em tudo é
prejudicial. No Espiritismo, ele provoca a confiança cega e infantil nas
coisas do mundo invisível e faz aceitar muito facilmente e sem cuidado
o que a reflexão e o exame demonstrariam ser absurdo ou impossível.
O entusiasmo não faz raciocinar, deslumbra. Essa espécie de seguidores
da Doutrina é mais prejudicial do que útil para a causa do Espiritismo; são
os menos competentes para convencer, porque se desconfia, com razão,
de seu julgamento; são enganados na sua boa-fé por Espíritos mistificadores,
enganadores, ou por pessoas que procuram explorar sua credulidade.
Se as conseqüências disso atingissem somente a eles, haveria
apenas inconvenientes; o pior é que dão, inocentemente, argumentos aos
incrédulos que procuram antes ocasiões de zombar do que de se convencer
e não deixam de impor a todos o ridículo de alguns. Isso, sem
dúvida, não é nem justo nem racional; mas, como já se sabe, os adversários
do Espiritismo apenas reconhecem a sua razão como de boa
qualidade, e procurar conhecer a fundo aquilo do que falam é o menor
de seus cuidados.


29 As maneiras pelas quais se aceita a Doutrina variam muito conforme
os indivíduos; o que persuade uns não consegue nada sobre outros;
um é convencido observando algumas manifestações, outro, pelas comunicações
inteligentes, e uma grande parte, pelo raciocínio. Até mesmo podemos
dizer que, para a maioria, os fenômenos não despertam interesse
ou são de pouco significado. Quanto mais esses fenômenos são extraordinários
e se afastam das leis conhecidas, maior oposição encontram, e isso
por uma razão muito simples: se é naturalmente levado a duvidar de uma
coisa da qual não se tem um conhecimento racional; cada um a vê de
acordo com o seu ponto de vista e a explica à sua maneira: o materialista
vê uma causa puramente física ou um embuste; o ignorante e o supersticioso
vêem uma causa diabólica ou sobrenatural; porém, uma prévia explicação
tem por efeito anular as idéias preconcebidas e aclarar, senão a
realidade, pelo menos a possibilidade do fenômeno; compreende-se antes
de o ter visto; acontece que, a partir do momento em que a possibilidade
é reconhecida, estamos a meio caminho da convicção.
30 Vale a pena tentar convencer um incrédulo obstinado? Dissemos
que depende das causas e da natureza de sua incredulidade; muitas
vezes, a insistência em querer convencê-lo o faz acreditar em sua importância
pessoal, que é uma razão para a sua teimosia. Aquele que não se
convenceu nem pelo raciocínio nem pelos fatos é porque ainda deve sofrer
a prova da incredulidade; é preciso confiar à Providência o momento de
circunstâncias mais favoráveis; muitas pessoas pedem para receber a luz;
não há que perder tempo com aquelas que a repelem. Dirigi-vos aos
homens de boa vontade, cujo número é maior do que se acredita, e seu
exemplo, ao se multiplicar, vencerá mais resistências do que as palavras. O
verdadeiro espírita nunca deixará de fazer o bem; há sempre corações
aflitos a amparar, consolações a dar, desesperados a acalmar, reformas
morais a realizar; aí está a sua missão, e nela encontrará sua verdadeira
satisfação. O Espiritismo está no ar; ele se espalha pela força dos fatos e
porque torna felizes aqueles que o professam. Quando seus adversários
sistemáticos o ouvirem ressoar ao redor deles, entre seus próprios amigos,
compreenderão seu isolamento e serão forçados a se calar ou a se render.
31 Para se ensinar o Espiritismo, como qualquer outra ciência, seria
preciso passar em revista toda a série de fenômenos que se podem
produzir, a começar pelos mais simples, chegando sucessivamente aos
mais complicados. Mas não pode ser assim, porque seria impossível
fazer um curso de Espiritismo experimental como se faz um de física e
química. Nas ciências naturais opera-se a matéria bruta, que se manipula
à vontade e sempre se tem a certeza de regular os efeitos. No Espiritismo,

lidamos com inteligências, que têm liberdade e nos provam a cada instante
que não são submissas aos nossos caprichos; é preciso, portanto,
observar, esperar os resultados colhendo-os no exato momento; daí termos
afirmado claramente que todo aquele que se vangloriasse de obtê-los à
vontade seria apenas um ignorante ou um impostor. Eis por que o verdadeiro
Espiritismo jamais será um espetáculo e nunca se apresentará sobre
um tablado. Realmente há algo de ilógico em supor que os Espíritos
venham desfilar e se submeter à investigação como objetos de curiosidade.
Os fenômenos poderiam não acontecer quando se tivesse necessidade
ou se apresentar em uma outra ordem totalmente diferente daquela
que desejaríamos. Acrescentamos ainda que, para obtê-los, é preciso
pessoas dotadas de faculdades especiais, que variam ao infinito conforme
a aptidão dos indivíduos; acontece que, como é extremamente raro que a
mesma pessoa tenha todas as mediunidades, é uma dificuldade a mais,
porque seria preciso sempre ter à mão uma verdadeira coleção de médiuns,
o que é totalmente impossível.
O meio de superar esse inconveniente é simples; basta começar estudando
a teoria na qual todos os fenômenos são passados em revista, são
explicados, podendo deles se inteirar, compreender a sua possibilidade,
conhecer as condições nas quais podem se produzir e os obstáculos que
se podem encontrar; independentemente da ordem em que venham a acontecer,
não há nada que nos possa surpreender. Esse caminho oferece ainda
outra vantagem: poupar o experimentador que quer operar por si mesmo
de uma série de decepções; precavido contra as dificuldades, pode se
manter em guarda e evitar adquirir experiências à sua custa.
Desde que nos ocupamos com o ensino do Espiritismo, seria difícil
dizer o número de pessoas que vieram depois de nós e, entre estas, quantas
vimos permanecer indiferentes ou incrédulas na presença dos fatos mais
evidentes e entretanto se convencer mais tarde por uma explicação
racional; quantas outras foram predispostas à convicção pelo raciocínio;
enfim, quantas foram persuadidas sem terem visto nada, simplesmente
porque haviam compreendido. É, portanto, por experiência que falamos,
e é também porque dizemos que o melhor método de ensinamento espírita
é o de se dirigir à razão antes de se dirigir aos olhos. É o que seguimos
em nossas lições, e temos alcançado muito sucesso.
32 O estudo preliminar da teoria tem uma outra vantagem: mostrar
imediatamente a grandeza do objetivo e o alcance dessa ciência; aquele
que se inicia no Espiritismo vendo uma mesa girar ou bater está mais
propenso ao espetáculo, porque não imagina que de uma mesa possa
sair uma doutrina regeneradora da humanidade. Sempre notamos que

aqueles que acreditaram antes de terem visto, porque leram e compreenderam,
longe de se ater ao superficial, são, ao contrário, os que mais
refletem, ligando-se mais ao fundo do que à forma. Para eles, a parte
filosófica é a principal e os fenômenos propriamente ditos são o acessório;
dizem a si mesmo que, se os fenômenos não existissem, teríamos uma
filosofia, que é a única capaz de resolver os problemas até agora insolúveis,
a única que apresenta uma teoria racional do passado do homem e de
seu futuro. Sua razão prefere uma doutrina que explica àquelas que nada
explicam ou que explicam mal. Todo aquele que reflete compreende muito
bem que a Doutrina se afirma e subsiste independentemente das manifestações
espirituais, que vêm fortificá-la, confirmá-la, mas que não são
a sua base essencial; o observador consciencioso não as repele; ao
contrário, ele espera as circunstâncias favoráveis que lhe permitirão
testemunhá-las. A prova de que avançamos é que, antes de ter ouvido
falar sobre as manifestações, uma grande quantidade de pessoas teve
a intuição da Doutrina e apenas aguardava que se lhe desse um corpo,
uma conexão lógica às idéias.
33 Também não seria exato dizer que aqueles que começam pela
teoria deixam de ter o conhecimento das manifestações práticas; ao
contrário, eles o têm, e, aos seus olhos, porque conhecem as causas,
elas se revelam mais naturais, precisas e valiosas; são os numerosos
fatos das manifestações espontâneas, das quais falaremos nos capítulos
a seguir. Há poucas pessoas que não têm conhecimento delas, ainda que
seja por ouvir falar; muitos as viveram pessoalmente, sem lhes prestar
maior atenção. A teoria explica os fatos, e esses fatos têm grande importância
quando se apóiam em testemunhos irrecusáveis, porque não tiveram
nem preparações nem cumplicidade. Se os fenômenos provocados não
existissem, os fenômenos espontâneos bastariam, e o Espiritismo igualmente
lhes daria uma solução racional, o que já seria muito. Por isso, a
maior parte daqueles que estudam a teoria com antecedência relembram-
se dos fatos vividos, que confirmam a teoria.
34 Estaria redondamente enganado quem supusesse que aconselhamos
desprezar os fatos; é pelos fatos que chegamos à teoria; é verdade
que para isso foi preciso um trabalho assíduo de muitos anos e milhares de
observações; mas, uma vez que os fatos nos serviram e servem todos os
dias, seríamos inconseqüentes com nós mesmos se lhes negássemos a
importância que têm, especialmente quando fazemos um livro destinado
a conhecê-los. Dizemos entretanto que, sem o raciocínio, os fatos não
bastam para se chegar à convicção; que uma explicação preliminar, expondo
as prevenções e mostrando que os fatos não têm nada de contrário

à razão, dispõe as pessoas a aceitá-los. Isso é tão verdadeiro que de dez
pessoas que assistam a uma sessão de experimentação, nove sairão sem
estarem convencidas, e algumas sairão mais incrédulas do que antes,
porque as experiências não respondem às suas expectativas. Será completamente
diferente com aquelas que puderem compreender os fatos mediante
um conhecimento teórico antecipado, porque esse conhecimento
iria servir de meio de controle, de forma que, por conhecerem, nada irá
surpreendê-las, nem mesmo o insucesso, pois sabem em que condições
os fatos se produzem e que não se pode pedir-lhes o que não podem dar.
A compreensão prévia dos fatos as coloca, então, a ponto de entender não
só todas as anomalias, mas também de notar uma multidão de detalhes,
de nuanças, muitas vezes delicados, que são para elas meios de convicção
e que escapam ao observador ignorante. Esses são os motivos que nos
levam a admitir em nossas sessões experimentais apenas pessoas com
noções preparatórias suficientes para compreender o que se faz; acreditamos
que as outras perderiam seu tempo ou nos fariam perder o nosso.
35 Àqueles que quiserem adquirir esses conhecimentos preliminares
pela leitura de nossas obras, eis a ordem que aconselhamos:
1o) O que é o Espiritismo? Essa brochura de apenas cem páginas é
uma exposição resumida dos princípios da Doutrina Espírita, um relance
geral que permite abraçar o conjunto sob um quadro restrito. Em poucas
palavras, vê-se o objetivo, e pode-se julgar sua importância. Contém as
principais questões e objeções que as pessoas novatas habitualmente
fazem. Essa primeira leitura, que necessita apenas de pouco tempo, é
uma introdução que facilita um estudo mais aprofundado.
2o) O Livros dos Espíritos. Contém a Doutrina completa ditada pelos
próprios Espíritos, com toda sua filosofia e todas as suas conseqüências
morais; é a revelação do destino do homem, a iniciação à natureza dos
Espíritos e aos mistérios da vida do além-túmulo. Ao lê-lo, compreende-se
que o Espiritismo tem um objetivo sério, e não é um passatempo fútil.
3o) O Livro dos Médiuns. É destinado a guiar a prática das manifestações
pelo conhecimento dos meios mais apropriados para se comunicar
com os Espíritos; é um guia tanto para os médiuns quanto para os evocadores
e o complemento de O Livro dos Espíritos.
4o) Revista Espírita1. É uma coletânea variada de fatos, explicações
teóricas e trechos destacados que completa o que foi dito nas duas obras
1 - Revista Espírita (1858-1869): publicação mensal dirigida por Allan Kardec até o seu desencarne
e por cujas páginas passaram os mais variados assunto de todas as partes do mundo
referentes à Doutrina Espírita, que se expandia. Há no Brasil uma excelente tradução

precedentes e que é de alguma forma a sua aplicação. A leitura pode ser
feita ao mesmo tempo, mas será mais proveitosa e mais inteligível especialmente
após a leitura de O Livro dos Espíritos.
Isso em relação a nós. Aqueles que querem conhecer tudo em uma
ciência devem necessariamente ler tudo o que é escrito sobre a matéria
ou pelo menos as coisas principais, e não se limitar a um único autor;
devem mesmo ler os prós e os contras, tanto as críticas como as opiniões
elogiosas, e estudar os diferentes sistemas, a fim de poder julgar com
conhecimento. Nesses assuntos, não indicamos nem criticamos nenhuma
obra, não querendo influenciar em nada a opinião que se pode formar dela;
trazendo nossa pedra ao edifício, fizemos o que devíamos; não nos cabe
ser juiz e parte, e não temos a ridícula pretensão de sermos os únicos portadores
da luz; cabe ao leitor separar o bom do mau, o verdadeiro do falso.

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